DESENHOS ESTEREOTIPADOS
Como vimos na aula anterior, os movimentos da criança
para a construção da sua representação dependem do tempo de desenvolvimento da criança
e da influência do meio sócio-histórico no qual ela está inserida.
Agora, aprofundaremos nossos estudos acerca destas
influências no que diz respeito aos estereótipos (O estereótipo é a [imagem]1 repetida,) presentes em sala de aula e
nas produções dos alunos.
CONSTRUINDO ESTEREÓTIPOS
Para falarmos em estereótipos, vamos conhecer o
conto da flor vermelha com o caule verde?
Conto popular
Era uma vez um menininho bastante pequeno que
contrastava com a escola bastante grande.
Uma manhã, a professora disse:
– Hoje nós iremos fazer um desenho.
"Que bom!” – pensou o menininho.
Ele gostava de desenhar leões, tigres, galinhas,
vacas, trens e barcos... Pegou a sua caixa de lápis de cor e começou a
desenhar. A professora então disse:
– Esperem, ainda não é hora de começar!
Ela esperou até que todos estivessem prontos.
– Agora, disse a professora, nós iremos desenhar
flores.
E o menininho começou a desenhar bonitas flores com
seus lápis rosa, laranja e azul.
A professora disse:
– Esperem! Vou mostrar como fazer. E a flor era
vermelha com caule verde.
– Assim, disse a professora, agora vocês podem começar.
O menininho olhou para a flor da professora, então
olhou para a sua flor.
Gostou mais da sua flor, mas não podia dizer
isso... Virou o papel e desenhou uma flor igual à da professora. Era vermelha
com caule verde. Num outro dia, quando o menininho estava em aula ao ar livre,
a professora disse:
– Hoje nós iremos fazer alguma coisa com o barro.
– "Que bom!” – pensou o menininho.
Ele gostava de trabalhar com barro. Podia fazer com
ele todos os tipos de coisas:
elefantes, camundongos, carros e caminhões. Começou
a juntar e amassar a
sua bola de barro.
Então, a professora disse:
– Esperem! Não é hora de começar! Ela esperou até
que todos estivessem prontos.
– Agora, disse a professora, nós iremos fazer um
prato.
"Que bom!" – pensou o menininho.
Ele gostava de fazer pratos de todas as formas e
tamanhos. A professora disse:
– Esperem! Vou mostrar como se faz. Assim, agora
vocês podem começar. E o prato era um prato fundo.
O menininho olhou para o prato da professora, olhou
para o próprio prato e gostou mais do seu, mas ele não podia dizer isso.
Amassou seu barro numa grande bola novamente e fez um prato fundo, igual ao da
professora. E muito cedo o menininho aprendeu a esperar e a olhar e a fazer as
coisas exatamente como a professora. E muito cedo ele não fazia mais coisas por
si próprio. Então aconteceu que o menininho teve que mudar de escola. Essa
escola era ainda maior que a primeira. Um dia a professora disse:
– Hoje nós vamos fazer um desenho.
"Que bom!” – pensou o menininho e esperou que
a professora dissesse o que fazer.
Ela não disse. Apenas andava pela sala.
Então veio até o menininho e disse:
– Você não quer desenhar?
– Sim, e o que é que nós vamos fazer?
– Eu não sei, até que você o faça.
– Como eu posso fazê-lo?
– Da maneira que você gostar.
– E de que cor?
– Se todo mundo fizer o mesmo desenho e usar as
mesmas cores, como eu posso saber o que cada um gosta de desenhar?
– Eu não sei.
E então o menininho começou a desenhar uma flor
vermelha com o caule verde...
FONTE: Disponível em:
<http://pcdec.sites.uol.com.br/ciranda/ternurinha.htm>.
Identificou semelhanças com seus desenhos?
A Arte como área de conhecimento deve ser
compreendida como momento de criação do aluno e não como momento de apresentação
de modelos e trabalhos homogêneos. A função da Arte na educação não deve ser
compreendida como meio de repetição e trabalho com desenhos prontos, cópias
feitas em série que não possibilitam a criação da criança. A Arte é
possibilidade, é imaginação, é criação, é expressão. Quem consegue criar quando
recebe a proposta pronta?
Neste momento é importante você compreender que
muitas dessas atitudes também fazem parte da nossa trajetória como alunos e
professores.
Pense rapidamente:
Se neste momento solicitássemos que você desenhasse
uma árvore, como ela seria? E se de repente solicitássemos o desenho de uma flor
ou de uma pessoa?
Veja a seguir, alguns exemplos claros do que
estamos falando:
DESENHOS ESTERIOTIPADOS
Oferecendo um trabalho pronto para o meu aluno
colorir, possibilito a criação individual de alguma criança? Consigo enquanto
educador explorar seu repertório visual e artístico?
Por vezes, os professores acabam limitando a
capacidade de criação das crianças por não permitirem a autonomia e a expressão
individual no momento das propostas metodológicas. “Lidamos quase que o tempo
todo com as linguagens da arte: desenho, modelagem, corporeidade, sonoridade,
pintura, gravura, escultura, cinema, desenho animado e tantas outras. Mas de
que forma nos apropriamos dessas linguagens?” (PILLOTTO, 2004).
A preocupação da autora está no modo como nos
apropriamos das diferentes linguagens da Arte, presentes no nosso dia a dia, e
como trabalhamos com estas linguagens em sala de aula. Ou seja, o modo como
levamos a Arte para dentro da esfera escolar.
Qual a função da arte na escola? Deixar as paredes
das escolas bonitinhas, enfeitadas com desenhos estereotipados? Desenvolver a
coordenação motora das crianças, através de atividades pontilhadas com
diferentes linhas e formas?
Esses modelos estereotipados não surgem do nada. É
importante compreender este processo de construção social de estereótipos para
então refletir antes de propor atividades aos alunos, antes de decorar a sala
de aula e expor imagens nas paredes.
Podemos dizer que a palavra estereótipo vem de
estereotipia, processo de impressão descoberto no ano 1000 na China.
Estereotipia vem do grego “stereós”, que significa firme,
compacto, imóvel, e “typos”, sinal, molde, representação. Já a palavra clichê
tem relação com o ato de estereotipar, produzir um estereótipo.
A maioria dos desenhos estereotipados oferecidos às
crianças parece uma caixa de tipos que, juntos, formam matrizes firmes e
enraizadas de tal maneira que é muito difícil se desprender dela. Muitos
professores apresentam estas matrizes aos alunos de forma tão natural que
parece até inconsciente.
É importante perceber que estas matrizes de que
estamos falando nem sempre estão impressas, algumas fazem parte da nossa memória,
e as máquinas copiadoras facilitam a sua reprodução constantemente.
A mais conhecida das
matrizes é a folha de papel reproduzida no mimeógrafo a álcool, largamente
utilizado nas escolas. Além do mimeógrafo, temos diversos recursos para
reproduzir estereótipos: todos conhecem processos simples de transferência da
imagem de um suporte para outro. Atualmente, nas escolas, as máquinas fotocopiadoras
fazem estas reproduções muito melhor e em menos tempo. (VIANNA, 2010, p. 1).
Os estereótipos não marcam presença apenas nos
trabalhos prontos oferecidos aos alunos, mas também nas representações
apresentadas pelos professores.
Nos dias atuais o mercado de produtos decorativos
para os ambientes escolares está muito amplo. É necessário avaliar estes
produtos, pois, com o surgimento do EVA, esta oferta aumentou e muito. É
importante pensar neste material como recurso de criação para as crianças, que
podem utilizá-lo para recorte, colagem e modelagem, no entanto os professores
devem criar os cartazes e a decoração dos ambientes com as crianças ao invés de
adquirir produtos prontos e estereotipados para a decoração de paredes.
O ambiente escolar não é a casa do professor, é o
espaço de aprendizagem das crianças e são os trabalhos delas que devem ser
valorizados e expostos no ambiente. Cabe ao professor construir esta “decoração”
com os alunos e não “para eles”.
Professores são referência para as crianças,
principalmente para as menores, que acreditam que tudo aquilo apresentado pelo
professor é o correto, “é belo”. É necessário cuidado e cautela em tudo que é
exposto em sala de aula e nos ambientes escolares, pois o que o professor expõe
faz sentido para a criança. Um modelo valorizado pelo professor automaticamente
é o belo. Daí a importância de construir os cartazes das salas de aula com os
alunos, possibilitando a criação e não a repetição e a cópia. Se o professor
expuser um cartaz de aniversário composto por um solzinho de olhinhos, como será
o sol desenhado pela criança?
Como formadores de opinião, precisamos propiciar a
construção/ criatividade das crianças e não a repetição de modelos apresentados
a ela.
PORTA-CRACHÁS
Pensar nos estereótipos deve ser um exercício
constante! Não basta ler o Caderno de Estudos, refletir e esquecer os dizeres
dos autores. É necessário mudar as atitudes em sala de aula. Esta é uma
construção, pois ninguém consegue mudar atitudes enraizadas de uma hora para
outra. Há uma desconstrução daquilo em que se acredita e uma construção de um novo
olhar que implicará novas atitudes e quebra de barreiras frente às
metodologias, frente à educação.
EM SÍNTESE VIMOS QUE:
• Os estereótipos são construídos socialmente e marcam presença nos
trabalhos de adultos e crianças.
• Desenhos prontos limitam a capacidade criativa.
• Os trabalhos e cartazes expostos pelo professor são referência e servem
como modelo para a construção das crianças.
• É necessário construir os cartazes e exposições com os alunos ao invés
de adquirir produtos prontos e estereotipados.
• A arte deve ser compreendida como vetor de desenvolvimento da
criatividade através das construções individuais e coletivas das crianças e não
através de propostas de pinturas de cópias de desenhos prontos e
estereotipados.