AULA DE HOJE: 22-06-21
Educação teatral e formação cênica
A criança tem inata a tendência de teatralizar.
Afinal, faz parte do universo infantil brincadeiras de encenação, ou seja,
dramatizando produz o mundo em miniatura no contexto em que vive inserida, cria
e recria cenários e situações, faz de conta.
Assim, a dramatização é um valioso recurso audiovisual
na formação e desenvolvimento da expressão pessoal e emocional da criança/
aluno. Trata-se de um ótimo instrumento para a educação estética, social,
moral, cívica, linguística e literária, ajudando no desenvolvimento da
personalidade da criança e, portanto, deve ter um trabalho integrado com o
currículo escolar.
O trabalho teatral na escola não tem como função
objetiva formar artistas, sendo sua função um meio, um caminho para aproximar e
promover a comunicação entre a arte e a criança, bem como possibilitar um
contato efetivo com o texto literário compreendendo as nuances teatrais,
constituindo percepções e formando significações estéticas e fruitivas. O
teatro, tanto quanto a dança, segundo Strazzacappa (2008), é a arte do
espetáculo vivo, que une o público e o artista, no universo peculiar da arte
que é cultural, lúdico, fantasioso, mágico, simbólico, criativo, perceptivo,
visual, táctil, olfativo, plural.
A teatralidade aflora num âmbito de composição cênica
e dramaticidade expressiva que mobiliza uma energia interior, relacionada com o
homo ludens, isto é, homem brincalhão, que gosta do jogo, do
divertimento, do prazer mobilizador, da potencia criativa, da fruição que
dessas ações emanam. (HUIZINGA, 1981). Na concepção de Ujiie et al (2003,
p.14) “[...] essa energia interna deve ser despertada e os professores precisam
saber aproveitar, bem as potencialidades de suas crianças (alunos), a fim de
possibilitar o trabalho com a linguagem teatral”, numa mescla expressiva,
gestual, oral, corpórea, letrada e espetacular, a partir de atividades
significativas, uma vez que “[...] só em atividades desse tipo é possível dar
sentido e função ao trabalho com aspectos como entonação, dicção, gesto e
postura que, no caso da linguagem oral, têm papel complementar para conferir
sentido aos textos e a sua interpretação”. (PCN - Língua Portuguesa, BRASIL, 1997,
p. 52).
A atividade teatral desempenha um papel importante no
processo de formação e alfabetização de crianças, também no que se refere ao
trabalho pedagógico que interage linguagem oral e escrita. Não se trata,
portanto, de entender esta ramificação artística como simples auxílio para
desenvolvimento visual e motor, mas sim como o exercício da expressão genuína
da criança; a exploração e a articulação de elementos de sistemas simbólicos,
que pode inclusive fazê-la compreender que a escrita é também um sistema
simbólico.
Nesse contexto, de acordo com Machado (1999), o teatro
é tão eloquente a ponto de reunir ao mesmo tempo códigos como o musical
(sonoplastia), o plástico (cenário), o corporal (performance) e o textual
(literário), sendo o palco do espetáculo e das linguagens por excelência. Nesse
universo de interações, a construção e a reflexão artística é intensa, na
medida em que a narrativa imaginada ganha dimensões concretas no gesto, na
fala, no som, na imagem, concebidos pelo autor da peça e materializada na arte
dramática.
É pelos motivos elencados que ponderamos a importância
da frequência de atividades com teatro no recinto escolar, como prática
significante para formação plena dos sujeitos. Em contrapartida, essa prática
esbarra na enorme dificuldade dos professores em lidar com todas essas
linguagens, cujas matérias-primas exigem conhecimento técnico mínimo, sob o
risco de cair na mesmice e no menosprezo da arte.
Neste sentido, respaldados por Machado (1972 e 1999) e
Blot (1982), evidenciamos os elementos estruturantes desta arte na sequência.
As histórias passadas ao teatro são chamadas peças teatrais. O elemento
principal de uma peça teatral é o ator, este incorpora o personagem e/
ou personagens, dando dramaticidade e densidade ao texto. O ator comunica
o texto ao público pela sua expressão: voz, movimentos e sensibilidade.
Considerando os aspectos expressivos, a voz comporta em si a dicção
(saber falar direito e com clareza da linguagem) e a impostação
(emitir/pronunciar corretamente e com tonicidade adequada). Quanto aos movimentos
é preciso, aprender a relaxar, dominar seus gestos e suas ações. Transmitir seu papel através da sua expressão
corporal, que congrega performance e cinestesia. Também complemento da
expressão é a sensibilidade que compreende equilíbrio emocional, inter e
intrapessoal, ingredientes manifestos na boa representação do ator, que toca e
sensibiliza sua plateia.
O teatro também é
composto por alguns elementos secundários, que, todavia, têm importância e são:
palco, cenário, figurino, iluminação e sonoplastia. Descritivamente
podemos considerar cada um destes elementos, como segue:
Palco: Qualquer lugar onde
haja espaço para se representar;
Cenário: Estrutura de
composição de cena, que no teatro tradicional deveria ter organização realista
e no teatro contemporâneo pode ser representado por alguns elementos, uma vez
que a tônica teatral é dada pela expressividade. O criador do cenário é
denominado cenógrafo;
Figurino: São as vestes, as
roupas, os elementos de figuração e caracterização cênica do personagem. O
figurino deve ser adequado à época e ao contexto de representação, portanto é
imprescindível a pesquisa. O idealizador dos figurinos é denominado figurinista;
Iluminação: É o jogo de luzes e
sombras. A iluminação é um efeito cênico que possibilita criar a magia e o
clima da peça teatral encenada. O responsável pela iluminação é o iluminador,
que compreende tudo acerca do posicionamento e alternância dos holofotes;
Sonoplastia: É a pauta sonora
integrativa da cena, música, ruídos, gritos, silêncio etc. O responsável pela
sonoplastia é o sonoplasta.
O trabalho pedagógico com a arte teatral na escola pode ser
iniciado, de acordo com Machado (1972 e 1999), por exercícios de relaxamento e
expressividade, jogos dramáticos, improvisações, leitura encenada, leitura de
textos literários, do gênero teatro até atingir o ápice da materialização de
uma peça teatral.
Para além da expressão cênica, no que tange a
construção textual, a elaboração de uma peça teatral permite o exercício
concreto de noções de começo, meio e fim em narrativas.
Blot (1982) destaca que em uma experiência teatral
desenvolvida com crianças de 8 a 11 anos, estas foram perspicazes na escolha do
tema, competentes no desenvolvimento do texto em forma de roteiro, o qual
determinava seus “grandes momentos”; a curva da intensidade dramática do
conjunto – clímax – adotando como coordenadas os diversos momentos isolados e a
sua intensidade dramática relativa, a ação organizada e estruturada pelas
crianças foi muito além das expectativas do
autor. Ainda no momento da criação do texto, o grupo pode discutir e optar por
gêneros, escolher e qualificar personagens-chave, exercitar, enfim dar
concretude ao texto, que se transformou em espetáculo cênico.
Mas é válido lembrarmos
que a apreensão da arte teatral não se forja diretamente na encenação de um
texto (peça), devemos iniciar por relaxamentos, passeios imaginários, jogos
dramáticos, leituras, improvisações, mínimas, até o alcance da forma mais pura
de dramaticidade.
As improvisações
são importantes e ativam a criação e a potência expressiva na criança. Por meio
de improvisações, o grupo de crianças consegue, no momento seguinte, a
transposição da realidade para o drama, como aprendizagem gradativa. O ápice,
contudo, da relação do texto literário com o teatro, que nos dá essa sensação
indizível de encantamento, acontece na efetivação concreta da história, na
visibilidade da imagem mental dessa história não no universo do possível, mas
no do palpável.
Somente sob esse olhar, as expressões
corporal, rítmica, musical e oral deixarão de ser, no universo da escola,
unicamente instrumentos de comemorações e/ou autoconhecimento psicologizantes,
transformando-se em um espetáculo de uma transgressão possível e concreta: a
ARTE TEATRAL.
Desse modo, com
intuito de articular uma proposta ilustrativa do que seja adequado para uma
ação pedagógica com a arte teatral, é que inserimos, a seguir, algumas
sugestões práticas para o dia-a-dia, sendo a indicação pautada em referências
da arte teatral e em nossa caminhada voltada ao seu ensino no espaço escolar e
extra-escolar.
Teatro e sugestões práticas para o
ensino em sala de aula
1.
O nascimento da árvore: Este é um exercício para aprender a relaxar, idealizado
por Machado (1999), no qual a criança/ator finge que é uma sementinha e deita
no chão. Depois começa a respirar calmamente e sempre respirando vai crescendo como uma pequena
árvore. Depois que a sementinha saiu da terra, então ela começa a crescer. A
sua coluna vertebral é o caule que vai sustentar a árvore. Os braços são os
galhos. Sempre respirando profundamente, e de olhos fechados, para não perder a
concentração, a árvore vai crescendo até ficar uma árvore adulta. Depois ela
vai murchando, murchando até virar de novo semente. Dessa forma, a árvore passa
por todas as etapas da vida. Ela foi pequena como uma criança, depois ficou um
arbusto como um adolescente, depois grande como um adulto; deu frutos e ficou
velha, morreu e tornou a virar semente para dar novos frutos. A autora
complementa que esse é um exercício muito bom para se aprender a relaxar o
corpo e a concentrar-se, pois sem educar a voz, os gestos e a sensibilidade,
não há ator.
2. Espelho:
Esta atividade é um
jogo dramático que serve para desenvolver os movimentos, a expressão corporal
coordenada e a criativa nas crianças. Para a realização, o professor deve
solicitar que as crianças se posicionem em duas colunas, constituindo pares,
voltados um de frente para o outro. A coluna da direita será no primeiro
momento o espelho, que deverá repetir em detalhes os movimentos de quem
reflete. A criança da esquerda deverá criar movimentos enquanto se aprecia no
espelho. No segundo momento, invertem-se as posições, repetindo o processo.
3. Feitiço
pode virar contra o feiticeiro: Jogo dramático interativo, que possibilita
desenvolvimento da inteligência emocional inter e intrapessoal, exercitação
expressiva e cinestésica.
Material necessário: 1 caixa com tampa, pedaços de papel, lápis ou caneta,
aparelho de som, CDS.
Procedimento: Entregar um pedaço de papel a cada criança e solicitar
que a mesma escreva algo que possa ser representado. Ex: “Imite uma galinha” ou
“Expresse através de mímica que está morrendo de fome”, etc. A seguir peça que
cada um dobre e deposite seu papel na caixa. Forme um círculo com os alunos
sentados no chão. Ao som de uma música inicia-se a brincadeira passando a caixa
dentre os participantes, ao parar a música, quem estiver com a caixa na mão
deve pegar um feitiço de dentro da caixa e representá-lo. No caso da caixa
parar em uma mesma criança, a próxima criança na sequência da roda, que ainda
não tiver representado, deverá fazê-lo. A brincadeira termina quando os
feitiços terminarem e todas as crianças tiverem representado.
4. Liquidificador:
Jogo dramático
interativo, o qual desenvolve a inteligência emocional, cinestésico-corporal,
espaço-temporal, bem como princípios éticos, políticos e estéticos. Para que o
jogo transcorra com êxito, é importante explicar bem os passos e atentar a
criança “liquidificador” da honestidade que deve ter, para que esta não troque
seus botões no decorrer da brincadeira. Posicionar as crianças em duas colunas,
voltadas uma de frente para a outra. No primeiro momento, a coluna da direita
será o liquidificador e a da esquerda será o acionador. A criança
“liquidificador” deverá escolher uma parte de seu corpo para ligar seu
mecanismo e outra para desligá-lo. Ao ser ligado, através do toque do
acionador, o liquidificador deverá realizar movimentos corporais até que seu
mecanismo seja desligado. A criança acionadora deverá adivinhar o botão de
ligar e o de desligar o liquidificador. Num segundo momento, invertem-se as
posições.
5. Uma
história dramatizada: O boneco de borracha: Esta atividade encontra-se no livro de Yogi (2003), é
um texto de autor desconhecido. À medida que a história vai sendo contada pela
professora, pode oportunizar exercitação corporal e alfabetização gestual a ela
e aos alunos participantes da ação. O desenvolvimento da atividade articula
expressividade, consciência corporal, lateralidade e equilíbrio.
História do
boneco de borracha
(Autor
Desconhecido)
Era uma vez um boneco de borracha que ficava de todos os jeitos com o
corpo, mas não falava não fazia barulho e mexia-se bem devagar.
Ele gostava de passear no jardim, olhando as flores coloridas, os
pássaros, as borboletas e as abelhas que voavam no alto.
De repente, veio um
vento forte... Nossa! O boneco de borracha ficou torto e agora ele anda todo
torto, virado só para um lado. E assim ele continuou o passeio.
Ufá! O vento parou, e ele então voltou ao normal. Agora conseguia andar
tanto para frente como para trás.
O vento voltou de novo. Aí, ele entortou-se para frente e anda olhando
para baixo. Parece até que procura alguma coisa no chão.
Mas, de repente, o vento mudou de direção e fez o boneco entortar-se
para trás. Agora ele só vê o que está lá no alto: o céu, os pássaros e as
borboletas.
Finalmente, o vento parou de vez. O boneco de borracha endireitou-se e
continuou o passeio observando tudo o que estava ao seu redor.
Engraçado é que quando o boneco de borracha chegava perto de uma árvore
ficava bem magrinho e bem comprido, do tamanho da árvore. Então, o boneco
andava elegante, esticado e comprido, quase alcançando o céu.
Quando chegava perto de uma roseira e sentia o cheiro das rosas, o
boneco ficava todo gordo e pesado como um elefantinho. Para andar, até fazia um
barulhão!
Ah! O boneco de borracha estava cansado de tanto passear. Então dele
deitou-se no chão para descansar e... surpresa ! Ele ficou pequenininho,
encolhidinho. Podia até caber numa caixa de sapato. Bem pequeno mesmo!
De repente, crescia, espalhava-se para todos os lados, crescia, crescia
e crescia. Crescia tanto que ocupava um grande espaço no chão.
Ficava pequeno de novo, pequeno, pequeno, bem pequeno. E adormecia todo
pequenininho....
Até que amanheceu e chegou o sol. O boneco de borracha, que estava
quietinho, foi se mexendo devagar, esticando-se para todos os lados, esticando
os pés, as pernas, o tronco, os dedos, as mãos e os braços.
Ele levantou-se e virou gente. Agora, sim, ele consegue conversar,
falar bem baixinho com quem está perto dele.
Essa é a história do boneco de borracha que virou gente, assim feito a
gente.
Retirado do livro:
YOGI, Chizuko. Aprendendo e brincando com músicas e com jogos. Belo
Horizonte: Fapi, 2003.
6. Teatro da Leitura: Esta atividade pode ocorrer pela
adaptação de livros de literatura infantil, para o formato de roteiro teatral,
por professores e crianças, articulando vozes para os personagens. A tônica da
atividade é a leitura dramática, dando tonicidade e intensidade ao texto. Antes
de realizar o teatro da leitura, os personagens devem ler o texto todo e suas
falas, dando a ela veracidade, bem como deverão criar por meio de sucatas e
outros materiais, um objeto ou elemento figurativo que caracterize o seu
personagem. O número de cópias do roteiro se articula ao número de personagens.
Síntese
Em síntese, objetivo que pretendíamos
nessas ultimas aulas foi apresentar e categorizar as ramificações artísticas,
em especial as quatro áreas que são consideradas como estruturantes do ensino
da Arte:
a Música: som, ritmo, harmonia,
melodia, altura, intensidade, duração, timbre e densidade,
as Artes Visuais: forma(esculturas),
imagem(desenhos), linha, cor, textura,
a Dança: movimento, tempo,
espaço, fluência e força, e
o Teatro: texto, personagem,
iluminação, cenografia, sonoplastia e caracterização.
Nesse contexto, buscou evidenciar seus elementos e
pontuar algumas estratégias de ensino elucidadas por sugestões práticas para o
dia-a-dia da escola e de sala de aula, compreendendo estas ramificações como
sensibilizadoras e formadoras de gostos artísticos e estéticos.